segunda-feira, junho 12, 2006

GOVERNANÇA SOLIDÁRIA OU DEMOCRÁTICA: UMA NOVA ELABORAÇÃO DE GOVERNO DEMOCRATICO NO BRASIL

Rudá Ricci


Do orçamento participativo à governança solidária

Porto Alegre, há tempos, se tornou a cidade brasileira com maior visibilidade em inovações na gestão pública, de caráter participativo, de todo o país. É uma cidade peculiar porque, dentre tantos atributos diferenciais, possui uma cultura política rara: segundo pesquisa DATAFOLHA, a grande maioria dos seus moradores se identifica como socialista e anticapitalista.
Por este motivo, embora tenhamos tido algumas experiências brasileiras que esboçaram o orçamento participativo (OP), foi em Porto Alegre que esta proposta de gestão participativa ganhou projeção mundial. A cultura política local e a competência administrativa impulsionaram inovações na gestão pública. A escolha do orçamento participativo como uma das experiências de bom governo pelo Habitat II e a realização do Fórum Social Mundial deram o acabamento final nesta projeção.

Contudo, a experiência do OP foi lentamente se multiplicando pelo país afora. Hoje, são quase 170 municípios que adotaram esta proposta de gestão orçamentária, apoiada em inúmeras metodologias. Recife investiu em plenárias de rua (são 600 a cada ano) e no OP Criança. São Paulo, na gestão Marta Suplicy, investiu no Ciclo do OP Temático (que discutia, além das obras e serviços do ciclo do OP Territorial, diretrizes gerais de governo) e a descentralização do Conselho do Orçamento Participativo, articulado às subprefeituras.

Mas, mais uma vez, foi Porto Alegre que experimentou o novo. Pressionado pela força do passado e do símbolo da gestão petista, o prefeito Fogaça (PPS) procurou incorporar o OP em sua administração e, a partir do Observatório Social (apoiado pela Rede Urb-AL), gestou o que foi denominado de Governança Solidária. O nome é uma derivação do que alguns cientistas políticos vêm sugerindo como governança social ou democrática. Governança é a capacidade de gerar respostas administrativas às demandas sociais que se apresentam ao governo. Em princípio, traduz a competência técnica e a agilidade dos administradores públicos. Quando se agrega o adjetivo social ou democrático, a governança passa a sugerir que a competência técnica e a agilidade se espraiem pela representação social, ampliando e descentralizando o processo decisório no município. É uma via de mão dupla, porque empodera a sociedade civil, mas exige uma profunda mudança de cultura e atitude dos representantes sociais do município. Da capacidade de formular uma agenda a partir de interesses dispersos e de mobilizar a população para pressionar as autoridades públicas, as lideranças sociais passam a obrigatoriamente saber analisar dados e informações gerenciais, saber elaborar projetos e ações intersetoriais (por território), saber gerenciar e monitorar a execução das ações, saber articular politicamente e comunicar com sua base social.

O governo de Porto Alegre instituiu uma Secretaria de Coordenação Política e Governança Social e implantou uma estrutura em rede que denominou de Governança Social. O desenho institucional que projetou é uma transição entre as parcerias do setor público com o privado e a formação de uma rede de co-responsabilidade na gestão pública com diversas estruturas de representação social, associadas ao OP. Na definição da Secretaria de Governança Solidária seria uma

Rede intersetorial e multidisciplinar que se organiza territorialmente para promover espaços de convivência capazes de potencializar a cultura da solidariedade e cooperação entre governo e sociedade local. Processo que promove um ambiente social de diálogo e cooperação, com alto nível de democracia e conectividade, estimulando a constituição de parcerias entre todos os setores da sociedade, através do protagonismo do cidadão gestor, ativo, empoderado e capacitado para perseguir e alcançar o desenvolvimento sustentável e governar.


Outro governo municipal, significativamente dirigido pela coligação PPS-PT, aprofundou e radicalizou a proposta de governança solidária. Trata-se do governo municipal de Montes Claros, situada no norte de Minas Gerais, tradicional reduto do conservadorismo clientelista mineiro, uma das regiões mais violentas do Estado. A vitória de uma coligação de esquerda foi uma das grandes surpresas das eleições municipais passadas e impôs um desafio histórico aos eleitos: consolidar uma nova cultura política local num município com 350 mil habitantes, liderança regional que envolve até mesmo o sul da Bahia. A proposta de governança solidária criou a estrutura que emoldurou uma série de iniciativas. Montes Claros incluiu um rol de princípios mais objetivos e articulados que os adotados em Porto Alegre:

Intersetorialidade: superação da fragmentação, articulando as secretarias municipais a partir de problemas centrais diagnosticados em conjunto, consolidando a ação governamental em parceria. O foco da ação governamental também se altera. Passa a ser o cidadão na família e seus vínculos de sociabilidade (igrejas, bairros, escolas, grupos de interesse, vínculos afetivos e culturais) o eixo de unidade de ação intersetorial e de leitura dos resultados concretos atingidos.

Territorialização: unidade de atuação intersetorial do governo, de atendimento de necessidades do cidadão e de seu grupo social, além da sua família, e motivação para que a população, em parceria com o governo municipal, identifique propostas e soluções, fortalecendo redes de solidariedade. O território é a unidade básica de participação política e social do cidadão, porque é onde este está inserido e se identifica, com a história de sua vizinhança e as conquistas e percalços de seu bairro.

Controle social: participação da população em todo processo de decisão, acompanhamento, fiscalização, avaliação e implantação das políticas públicas. Na prática, significa fortalecer os conselhos municipais de gestão pública (setoriais e de direitos), articular esses conselhos a partir da implantação da Casa da Cidadania, implantar sistemas de comunicação e acesso à informação para a população municipal (acesso aos dados sobre o município e serviços públicos oferecidos, garantindo interatividade do cidadão com os meios de comunicação), adoção do governo itinerante com presença nos pólos regionais, implantação de comitê gestor da governança solidária do município, implantação da lei de responsabilidade social e adoção do orçamento participativo.

Extraido do site do Instituto Cultiva http://www.cultiva.org.br/

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